Poemas · Janeiro 20, 2022

Sem título, de Leonora Rosado

Plusieurs fois
A mão escolhe a sombra
O sangue e bebe da sua sede
Sento-me na rocha e vejo o futuro passar num barco
Há demasiados lenços rasgados e eu quero escolher um adeus
fluvial
Há demasiados compassos adiados e então a melodia seca tudo
em redor
A mão continua sem hesitar a escolher a farpa
A sombra
O clavicórdio
O astro menor
E é quando o desespero enfuna que me sento com um livro entre
a morte e a sabedoria
Aqui as aves recuam e se houvesse vento
Seria condescendência
Aliteração inclinada sobre as nuvens
O cais é o instinto de quem se apega à hipocrisia que lhe permite
um firme solo
Uma casa autêntica sem o caos de poemas impressos em livro sem
estantes nem memória
Com a naturalidade do sabão no soalho e o pão fresco na mesa
Com os olhos postos no crucifixo na h(ora) da refeição
Eu persigo o voo das gaivotas que crescem sem ninho
O amontoar das artes sem presente
E o que fiz ou fui que permaneça anónimo como uma longa carta
que não se assina

 

Leonora Rosado