Traduções · Janeiro 21, 2023

Acanto, de Arthur Sze

Quando fechas os olhos, consegues distinguir uma fiada
de cavalas penduradas pela cauda e atadas a um fio que atravessa
a rua íngreme de lado a lado; deitas água no raki¹ –
e vês como se transforma em “leite de leão”;
dás umas dentadas numa beringela fumada com iogurte;
apontas para um salmonete numa travessa de peixe.
Apercebes-te do som de pingos de água,
Baixas-te para te aproximares da cabeça da Medusa que, de
pernas para o ar,
está na base da coluna de um reservatório:
uma gota d’água salpica-te a testa.
Observas folhas de acanto esculpidas, depois
dezoito mulheres em estranhas posturas
de luto ladeando um sarcófago;
viras-te, devido a um ruído, para luminosidades cintilantes:
dezoito homens e mulheres envergando camisas de segurança
irrompem pela rua apinhada
em busca de heroína. Sentes o cheiro a açafrão,
cardamomo, incenso, canela, gengibre,
galanga, tomilho, anis estrelado, erva-doce:
abres os olhos e vês sanguessugas num recipiente
meio cheio de água – verde hena que se encontra
numa caixa ao lado de amoras brancas.
Tilintam chocalhos no pescoço das cabras;
Passas os dedos pelos fragmentos
de vasos de terracota embutidos nas paredes de pedra
de casas; lanças o olhar para o mendigo
cujo pé inchado atingiu a dimensão
da sua cabeça; sobes com dificuldade até ao templo de Atena,
ao luar; sentas-te numa coluna quebrada,
contemplas Lesbos, para lá do golfo,
onde há luzes que brilham ao longo da curvatura
de uma baía. Ao crescente luar, a água agita-se,
prateada, em manchas largas.
Dói-te pensar em como a paixão é um emaranhado
de seda nas tuas mãos, fechas os olhos,
desatas a seda num fio contínuo.

¹raki: licor turco de anis, que, com água, torna-se branco leitoso
advindo daí o nome “leite de leão”.

When you shut your eyes, you find a string
of mackerel tied by the tail over and across
the sloping street; pour water into raki¹
and watch it cloud into “lion’s milk”;
nibble smoked aubergine with yogurt;
point to red mullet on a platter of fish.
You catch the sound of dripping water,
squat to be near to the upside down Medusa
head at the column base in a cistern:
a drop of water splashes your forehead.
You note carved acanthus leaves, then
eighteen women in singular postures
of mourning along the sides of a sarcophagus;
turn, at a noise, to bright lights:
eighteen men and women in security shirts
swarm through the covered street,
search for heroin. You smell saffron,
cardamom, frankincense, cinnamon, ginger,
galingale, thyme, star anise, fennel:
open your eyes to leeches in a jar
half-filled with water–green powdered henna
in a box alongside white mulberries.
The bells around the necks of goats clink;
you run your fingers along the fragments
of terra-cotta pots built into the stone
walls of houses; blink at the beggar
whose foot has swollen to the size
of his head; stagger up to Athena’s temple
by moonlight; sit on a broken column,
gaze out across the gulf to Lesbos,
where lights glimmer along the curve
of a bay. In waxing moonlight, the water
is riffled, argentine, into wide patches.
You ache at how passion is a tangle
of silk in your hands, shut your eyes,
unstring the silk in one continuous thread.

¹raki: (Turkish) an aniseed liqueur, which,
with water, turns milky white
Arthur Sze